GUARÁ – O VÔO DA AVE NA VELOCIDADE DO LOBO
Guará,
nasceu ao lado de uma lagoa feia
onde o universo iluminava a noite sombria
e por entre estrelas cadentes
transitavam aves raras de asas claras...
Aves e lobos mesclavam-se com poder absoluto
espontâneos e líricos como magia,
onde o silencio da noite anunciava o novo dia.
Homens que vieram das Minas gerais
caminhavam lentamente pelos córregos e cerrados.
Desbravavam as terras de Laje...
Somente o Sol ao fundo
aquecia-os, compenetrados,
trabalhando silenciosamente em sua futura vernissage:
a estação Ferroviária.
Assim nascia a minha cidade
incompreendida sobre as terras planas
heroica entre segredos e caravanas,
desnudada
pelo progresso da Companhia Mogiana...
Devagarinho
o céu foi refletindo a nova vida
e os peixes foram habitando o novo mundo.
Desenvolvimento, progresso, governo,
e povo...
Descobriu-se que a cidade empinava suas asas na velocidade de um lobo.
Minha cidade já era uma lagoa gigante
e já abraçava os mares, sua s fortalezas e seus montes.
Minha cidade já estava no mapa
e a sua história já era contada pelos viajantes.
Silenciosamente
como a música procurando movimentos
e dissonantes,
como os anjos cantando sonhos e serenatas,
como a leveza das folhas, das copas, das árvores mais altas...
Cidade que aperto no peito
histórias que escrevo ao mundo
aves que a sobrevoam e que me comovem
e lembranças que flutuam em minha memória refletidas do meu próprio jeito.
Essa cidade que silenciosamente eu vejo no ponto norte do mapa,
essa, das estrelas que caíram em suas águas mansas,
guarda meu íntimo mistério
desde o tempo em que estou mais velho.
Guarda segredos do rio Sapucaí
e lembranças lavadas pelas correntezas.
Naquelas águas mansas,
todas as sutilezas dali.
Ou mais que minha própria vida,
para as entranhas de outros continentes.
Ou mais que o espírito dos homens,
reciclados, artistas de novos inventos,
percorro e morro reencontrando-te,
Guará,
a cidade nascida e criada pela bandeira dos quatro elementos.
Sei que você não é totalmente minha,
mas como pode uma simples lagoa
guardar bem no fundo em seu velho baú
toda a relíquia de minha infância?
Todos os sonhos das nossas crianças
e os segredos dos profetas que cantam nas tuas estâncias?
E o cheiro que sinto dos lobos?
E o desenho longínquo do voo das aves?
Ainda restam as estórias dos velhos que habitavam tuas praças...
Será que a cidade espera mais mil anos, silenciosa, em sua magnificência?
A noite, a cidade embriaga seus moradores
a bailar pelas ruas aromáticas
percorrendo passeios infinitos...
Guará abriu as portas ao novo mundo
e já não vejo o rastro daquela velha lagoa.
Aguarda pacientemente pela saudade de seus filhos
mesmo daqueles que estão em outros distantes mundos...
Qualquer casa de tuas ruas poderá
abrigar-me sempre,
e para sempre em tua geografia,
pelo longo caminho da minha rua
pela beleza do teu céu estrelado
onde a vida, as profecias e a natureza
passam velozmente
e nossas lembranças passam ao lado...
Guará
Ainda não sei nada das tuas entranhas
mas escuto-te e sinto-te
todas as manhãs...
Esculpo-te feito escultura
como se desbastasse lascas de pedra
e te fizesse inteira,
numa linda pintura.
Esculpo-te noite e dia
como se cada casa tua,
filho, cidadão ou amigos dos bancos da praça,
perfilassem palavras, lirismo e magia
e que completassem com graça
esta silenciosa poesia.
Guará
Não me atrevo a escalar teus muros
ou imaginar as páginas do teu futuro.
Não arrisco a decifrar teus sonhos
A escrever histórias de teus enigmas...
Prefiro no entanto
guardar-te em meu peito
do meu próprio jeito
e por muitos séculos...
Prefiro antes,
em meu divã
morrer com sabedoria
carregar minhas utopias
antes que alguma coisa mude no universo.
E deixar-te imprevisível
desafiando
as regras da incerteza.
O que faz o filho sonhar além do sonhos dos seus pais?
Porque só haverá paz entre os que nasceram por lá...
Porque apenas quem viveu Guará
Sabe que no fundo de uma lagoa
uma ave que e um lobo sempre haverá...
O mundo não é nada
na eternidade
apenas o desenho do vôo da ave
reflete a vida que acontece
em nossa cidade.
Wildon-20/01/2012